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  • Como funciona o novo medicamento para tratar disfunção sexual nas mulheres

    Cada vez mais as questões relacionadas à sexualidade e à libido das mulheres vêm ganhando espaço no âmbito social e científico. Uma prova disso é o novo medicamento aprovado nos Estados Unidos conhecido como “Viagra Feminino”. A substância, na verdade, chama flibanserin, e será comercializada como Addyi.

    Antes mesmo de estar disponível no mercado, o produto vem causando comoção no Brasil e no mundo, por ser o primeiro ativo para tratar disfunção sexual feminina e também por ser facilmente associado a uma versão do sildenafil, (Viagra masculino) para mulheres.

    No entanto, é importante lembrar que a sexualidade de homens e mulheres não funciona da mesma forma, por isso é um equívoco estabelecer alguma similaridade entre os dois fármacos, principalmente em relação à excitação da mulher. “O desejo feminino é multifatorial, ou seja, não é um único elemento que vai ocasionar a falta de libido.”, afirma Carmita Abdo, psiquiatra Coordenadora do Programa de Estudos de Sexualidade (ProSex) da Universidade de São Paulo (USP). Isso quer dizer que a ausência de desejo sexual na mulher pode estar ligada à pouca harmonia do casal, depressão, problemas no trabalho, outras doenças, uso de certos medicamentos, além de vários outros fatores ou uma combinação deles.
    Quais são as diferenças entre os medicamentos?

    Os medicamentos flibanserin (feminino) e o sildenafil (masculino) atuam em locais distintos do organismo, e de maneiras diferentes. No entanto, eles foram as primeiras drogas para auxílio no tratamento de desordens sexuais, femininas e masculinas, aprovadas para uso. Confira a seguir a ação de cada um:

    Masculino

    “O sildenafil (viagra) é uma substância que age provocando uma dilatação dos vasos localizados nas extremidades do corpo, especialmente do pênis”, diz Carmita. Além disso, a especialista explica que o remédio só será eficaz se o homem que o usar tiver o desejo preservado, ou seja, se ele fica excitado mas não consegue manter a ereção. Com o uso de apenas um comprimido já é possível sentir a ação positiva do remédio.

    Feminino

    Já com o flibanserin, que é um antidepressivo, a atuação é central e não periférica. Isso significa que ela “vai agir no cérebro e causar uma série de alterações que não são locais, influenciando no comportamento como um todo, inclusive, no comportamento sexual“, alerta Carmita. Outra diferença é que “a ação do medicamento vai se dar no desejo, e não precisar dele para se manifestar. Ela age sobre o desejo e não com a presença do desejo”, explica.

    Qual é a periodicidade do medicamento?

    Com relação à posologia, a mulher precisa fazer uso de um comprimido diariamente por cerca de três semanas para que se comece a notar um aumento do interesse sexual. “O remédio começa a agir em três semanas, e vai atingir em geral na quarta ou quinta semana o pico de ação. Caso até a oitava semana não se perceba nenhum efeito, a chance é que essa mulher não tenha nenhuma resposta a esta medicação”, afirma Carmita.

    Como ele funciona no organismo?

    A forma como o medicamento atua no organismo e se ele realmente seria eficaz são pontos que ainda estão sendo discutidos e estudados. “Não acredito na sua eficiência isolada, tão pouco que é uma pílula mágica. Minha experiência clínica afirma, mesmo nos casos masculinos, que desejo trata-se com terapia sexual, ou seja, com a ajuda de um psicanalista ou psicólogo com especialização em sexualidade”, afirma a sexóloga e psicanalista Lelah Monteiro, membro da Associação Brasileira de Fisioterapia em Saúde da Mulher e da Sociedade Internacional de Medicina Sexual.

    Segundo Carmita Abdo, que também é psiquiatra especialista em sexualidade, a medicação tem a capacidade de liberar dopamina, modificando os níveis de circulação desse neurotransmissor pelo corpo. A substância é responsável por fazer a mulher procurar por recompensas mais gratificantes, possibilitando que ela esteja mais disposta a ter relações sexuais. Além disso, o flibanserin também ajuda a controlar os hormônios que inibem a manifestação da sexualidade, como a serotonina.

    Quando o remédio é indicado?

    Antes de falar quando e para quem o flibanserin (“viagra feminino”) é indicado, é preciso entender que “a libido feminina é complexa, pois está relacionada a diversos fatores como os hormônios, alimentação, exercícios físicos, além da presença de algumas substâncias que atuam no sistema nervoso central. Por isso, seu tratamento não pode ser visto de forma simplista e exige não só uso de medicações, mas uma mudança no hábito de vida e, também um tratamento psicoterápico da mulher ou do casal”, ressalta Heloisa Ferreira Brudniewski, especialista em ginecologia e obstetrícia pela Federação Brasileira das Associações de Ginecologia e Obstetrícia (FEBRASGO). Logo, “a medicação não é recomendada para aumentar a performance sexual da mulher”, diz a sexóloga Lelah Monteiro.

    Da mesma forma, a ideia não é mudar completamente o perfil sexual da mulher, mas sim aumentar sua libido. Sendo assim, o flibanserin é indicado para mulheres com desejo sexual hipoativo na pré-menopausa em que a causa não seja:

    Depressão
    Deficiências hormonais
    Doenças físicas, como as cardiovasculares
    Doenças de ordem psiquiátrica, como ansiedade
    Conflitos de relacionamento
    Uso de medicamentos que acarretem na falta de libido
    Para tanto, “o médico vai fazer primeiro uma extensa anamnese e depois pode precisar de alguns exames para verificar se há alguma causa física. Nesses casos, a falta de desejo é secundária e pode ser resolvida quando o problema anterior for tratado ou depois que se fizer a troca de medicamentos”, diz Carmita.

    “Claro que a busca por novas medicações que auxiliem é sempre importante e traz novos recursos para o tratamento, mas muitas vezes é necessário adotar outras medidas também. Quando a mulher sentir o problema, ela deve sempre discuti-lo com o ginecologista, para buscar o melhor tratamento”, orienta Heloisa.

    Quais são os efeitos colaterais?

    A grande preocupação com relação ao flibanserin, o “viagra” feminino, são os efeitos colaterais, uma vez que nos testes clínicos 13% das mulheres decidiram parar com a medicação por este motivo. Dentre eles estão tontura, boca seca, hipotonia e desmaio. A mulher pode apresentar maior dificuldade de manter a sua consciência, ter fraqueza, uma sensação de fadiga, e isso é potencializado sob o efeito do álcool.

    Nos Estados Unidos o flibanserin só será vendido com receita médica retida e também será conferido se o médico que solicitou o remédio tem capacidade de avaliar essa questão, pois ele deverá se responsabilizar por cada paciente e acompanhar os efeitos colaterais muito de perto.

    “Sem dúvida o número de pessoas que tiveram os efeitos colaterais é bastante significativo. Mas, cada caso é um caso, e dependendo do grau de alteração do desejo, terão mulheres que não vão apresentar todos os sintomas. Pedofilia. Essa é mais uma razão pela qual a mulher em tratamento precisa ser avaliada o tempo todo, pois é necessário verificar se os efeitos colaterais continuam tão intensos quanto no início ou diminuem, ou se o custo que ela está tendo supre ou não o benefício e também se a prescrição está adequada”, complementa.

    Qual o papel da depressão na falta de libido feminina?

    A depressão é um importante fator de comprometimento do desejo sexual da mulher, mas por quê? O que acontece é que a depressão possivelmente compromete a atuação dos sistemas de gratificação cerebral. Eles são vias de células nervosas, responsáveis pelos comportamentos motivados, tais como beber, comer e procurar sexo. ?Os sistemas são influenciados por vários neurotransmissores, porém parece que a via final sempre envolve o hormônio da dopamina, a principal das áreas de gratificação. Assim, o prejuízo do funcionamento desses locais estaria relacionado à diminuição da motivação, incluindo a do comportamento sexual”, explica Ivan Mario Braun, psiquiatra e terapeuta comportamental do Instituto de Psiquiatria do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (USP).

    Além disso, alguns dos medicamentos também têm um papel na diminuição da libido. Segundo Braun, isto ocorre sobretudo quando se usam antidepressivos que aumentam a quantidade de serotonina presente entre as células nervosas. Exemplos de antidepressivos que possuem esta ação são a fluoxetina, sertralina, paroxetina, citalopram, escitalopram, venlafaxina, desvenlafaxina, duloxetina, imipramina, amitriptilina e clomipramina, Este efeito é inexistente ou bem menor com antidepressivos que não possuem esta ação sobre a serotonina, tais como a trazodona, bupropiona, mirtazapina e agomelatina.

    O que temos de similar no Brasil?

    Apesar de ainda não termos nenhum medicamento para disfunção sexual feminina em si aprovado no Brasil, e a ANVISA ainda não ter sido consultada sobre o flibanserin, as mulheres que se sentem incomodadas com a forma que está a sua sexualidade podem e devem procurar ajudar médica. “Atualmente utiliza-se o uso de algumas substâncias naturais ou hormônios para tentar estimular o desejo sexual na mulher. Mas vale lembrar que o uso isolado de medicamentos pode não ser suficiente para resolver o problema, sendo necessário a abordagem do tema de forma multidisciplinar, com mudanças no estilo de vida e tratamento psicoterápico acompanhado por profissionais especializados no assunto”, afirma a ginecologista Heloisa Brudniewski.

    Sobre a aprovação da medicação nos Estados Unidos, a coordenadora do ProSex, Carmita Abdo, opina: “O lado positivo não é intrínseco a substância em si, mas ela traz, na sua vinda, duas possibilidades boas. A primeira é a de inaugurar uma etapa de mais pesquisas na área da sexualidade feminina e outras novas formulações com este objetivo, e a segunda é que o assunto seja mais debatido e conhecido pelas mulheres, médicos e população como um todo – até para que se possa fazer o diagnóstico e prescrição de medicamentos. De repente, podemos dizer que estamos vendo a sexualidade da mulher por uma outra perspectiva”.

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