Rebaixamento da Nota de Crédito dos EUA Abala Mercados Globais e Acende Alerta sobre Dívida Pública
Em mais um capítulo tenso da economia mundial, o rebaixamento da nota de crédito dos EUA anunciado pela agência Moody’s na última sexta-feira (16) desencadeou uma forte reação nos mercados globais nesta segunda-feira (19). A classificação dos Estados Unidos caiu de “AAA” para “AA1”, sinalizando preocupação crescente com a trajetória fiscal da maior economia do mundo. Segundo a agência, o endividamento excessivo e os juros elevados colocam os EUA em situação mais vulnerável do que outros países com notas semelhantes.
Esse rebaixamento da nota de crédito dos EUA se baseia no volume de dívida pública — que já ultrapassa US$ 36 trilhões — e nos custos crescentes com os juros dessa dívida. O comunicado da Moody’s destacou que “administrações sucessivas e o Congresso norte-americano falharam em chegar a um consenso para reverter os déficits fiscais anuais e o aumento do custo de financiamento. A avaliação, embora técnica, traz repercussões diretas sobre o apetite por risco nos mercados.
Mercados reagem com aversão ao risco após rebaixamento da nota de crédito dos EUA
A reação foi imediata. Os futuros das bolsas de Wall Street abriram em forte queda nesta manhã, pressionados não apenas pelo rebaixamento da nota de crédito dos EUA, mas também pela percepção de que os riscos fiscais continuarão a se agravar nos próximos anos. Investidores se mostram apreensivos com a capacidade do governo norte-americano de conter o crescimento da dívida pública.
Somado a isso, o ambiente político em Washington permanece polarizado. Ontem, a Câmara dos Representantes — sob controle republicano — aprovou um amplo pacote de cortes tributários batizado por Donald Trump de “Beautiful Bill. A proposta torna permanentes os cortes aprovados em seu primeiro mandato e prevê alívio fiscal temporário sobre gorjetas, horas extras e juros de financiamentos automotivos. Analistas já alertam que o projeto pode ampliar a dívida em cerca de US$ 3,3 trilhões.
Combinado ao rebaixamento da nota de crédito dos EUA, esse movimento fiscal mais expansionista alimenta temores de que os EUA estejam se aproximando de uma crise de confiança no mercado de títulos soberanos. A própria Moody’s ressaltou que medidas como essa agravam a dificuldade de estabilização das contas públicas no médio e longo prazo.
Ibovespa e dólar sentem os efeitos da turbulência externa
No Brasil, os reflexos não demoraram a aparecer. O Ibovespa fechou o último pregão com leve queda de 0,11%, aos 139.187,39 pontos, mesmo tendo acumulado uma valorização semanal de 1,96%. O dólar à vista recuou 0,16%, sendo cotado a R$ 5,6695, mas encerrou a semana com alta de 0,26%, refletindo o movimento de aversão ao risco dos investidores estrangeiros.
O ETF iShares MSCI Brazil (EWZ), principal índice brasileiro negociado em Nova York, registrou queda de 0,43% no pré-market, cotado a US$ 27,88. A pressão sobre ativos de países emergentes tende a se intensificar quando há um movimento global de busca por segurança — o que geralmente favorece ativos considerados “porto seguro“, como os títulos do Tesouro dos EUA, ouro e dólar.
Cenário externo turbulento: bolsas asiáticas e europeias também operam em baixa
Na Ásia, o impacto do rebaixamento da nota de crédito dos EUA coincidiu com a divulgação de dados da produção industrial da China. O crescimento de 6,1% em abril, embora acima da expectativa de 5,5%, veio abaixo dos 7,7% registrados em março, o que reforçou a percepção de desaceleração gradual da economia chinesa.
As bolsas asiáticas fecharam no vermelho: o Nikkei caiu 0,74% em Tóquio, o Hang Seng recuou 0,05% em Hong Kong, e Xangai encerrou o pregão estável. Na Europa, os mercados também abriram em queda, ampliando a cautela dos investidores em relação ao cenário global.
As exportações da China, que surpreenderam positivamente no início do mês, não foram suficientes para sustentar o otimismo. Economistas atribuem os bons resultados a remessas redirecionadas por exportadores que buscam evitar tarifas impostas por Donald Trump, o que indica que o efeito positivo pode ser pontual.
Internamente, foco se volta para indicadores e cenário fiscal brasileiro
No Brasil, a agenda desta semana é considerada fraca em termos de indicadores econômicos. Os destaques desta segunda-feira incluem a divulgação do Relatório Focus e do Índice de Atividade Econômica do Banco Central (IBC-Br), que serve como uma prévia do Produto Interno Bruto (PIB).
Além disso, o presidente do Banco Central, Gabriel Galípolo, participa de uma conferência do Goldman Sachs em São Paulo, onde deve comentar sobre os próximos passos da política monetária e o rumo da taxa Selic.
A possível continuidade dos cortes na Selic, combinada ao ambiente externo desafiador após o rebaixamento da nota de crédito dos EUA, coloca em xeque o desempenho de ativos locais, em especial a renda variável e os investimentos estrangeiros no país.
Exportações brasileiras sob ameaça após surto de gripe aviária
Outro fator que deve afetar os mercados locais é a confirmação de um caso de gripe aviária no Rio Grande do Sul. A notícia levou a China a suspender a habilitação de 51 frigoríficos brasileiros para exportações de produtos avícolas. Outros países também anunciaram medidas semelhantes, o que poderá afetar significativamente a balança comercial brasileira.
O Ministério da Agricultura estima perdas entre US$ 100 milhões e US$ 200 milhões por mês. As empresas mais afetadas devem ser JBS (JBSS3) e BRF (BRFS3), líderes no setor. Com esse cenário, o mercado monitora de perto os desdobramentos da situação sanitária e os possíveis impactos sobre os preços das ações e a atividade econômica do setor agroexportador.
Um sinal de alerta para o sistema financeiro global
O rebaixamento da nota de crédito dos EUA é mais do que uma mudança técnica de avaliação. Trata-se de um sinal de alerta para investidores, governos e formuladores de políticas públicas. Em um cenário global ainda marcado por incertezas geopolíticas, inflação persistente e juros elevados, qualquer fator que comprometa a confiança na economia norte-americana tem o potencial de provocar ondas de choque ao redor do mundo.
Ao mesmo tempo, os países emergentes como o Brasil devem estar atentos à volatilidade que essas notícias trazem. O mercado financeiro, extremamente sensível a qualquer oscilação no risco fiscal global, reage com força às alterações no cenário macroeconômico, como observado nesta segunda-feira. Resta saber como os EUA e outras economias desenvolvidas lidarão com o desafio de equilibrar crescimento, responsabilidade fiscal e credibilidade no longo prazo.