Lula reage às tarifas dos EUA contra o Brics e reforça soberania dos países

Lula reage às tarifas dos EUA contra o Brics e reforça soberania dos países do bloco

O presidente Luiz Inácio Lula da Silva se manifestou com firmeza nesta terça-feira (8) contra as declarações recentes do presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, que ameaçou impor tarifas dos EUA contra o Brics. A tensão entre Washington e o grupo econômico formado por países emergentes voltou a crescer após Trump acusar o bloco de adotar políticas antiamericanas e anunciar a intenção de aplicar uma tarifa comercial de 10% sobre produtos provenientes dos países-membros.

A fala do presidente brasileiro ocorreu ao lado do primeiro-ministro da Índia, Narendra Modi, durante coletiva à imprensa em Brasília. A resposta de Lula reforça a posição do Brasil e dos demais integrantes do Brics em defesa da autonomia e da autodeterminação econômica frente a pressões externas, especialmente dos Estados Unidos.

A seguir, entenda o contexto político-econômico do embate entre EUA e Brics, o que significam as tarifas anunciadas por Trump, os impactos esperados no comércio internacional e a posição brasileira diante desse novo capítulo de tensão geopolítica.


O que motivou a ameaça de tarifas dos EUA contra o Brics?

O estopim da nova crise diplomática foi a declaração de Donald Trump, durante reunião de gabinete na Casa Branca, afirmando que os países do Brics seriam alvo de uma tarifa comercial de 10% “muito em breve. A justificativa do líder norte-americano é de que o bloco adota políticas contrárias aos interesses dos Estados Unidos, configurando, segundo ele, uma postura “antiamericana”.

A ameaça não se limita aos membros originais do Brics (Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul), mas se estende aos novos integrantes: Egito, Emirados Árabes Unidos, Etiópia, Indonésia e Irã — que passaram a compor o bloco na mais recente expansão aprovada em cúpula no Rio de Janeiro.


A resposta de Lula: soberania nacional e defesa do multilateralismo

Em seu discurso, Lula rejeitou veementemente qualquer tentativa de ingerência sobre os assuntos internos do Brics, reafirmando que todos os países do grupo são soberanos e têm o direito de tomar decisões políticas e econômicas de maneira independente.

Segundo o presidente brasileiro, a cúpula do Brics no Rio de Janeiro não tem por objetivo confrontar qualquer país, mas sim consolidar uma alternativa geopolítica multipolar e fortalecer o multilateralismo — conceito fundamental que norteou a diplomacia internacional após a Segunda Guerra Mundial e que, na visão de Lula, está sendo ameaçado pelo crescimento do extremismo e da unilateralidade.


Crescimento do Brics e o desconforto dos EUA

O desconforto do governo dos Estados Unidos com o Brics não é novo. Desde a criação do bloco, a proposta de fortalecimento da cooperação entre economias emergentes tem sido vista como um contraponto ao poderio norte-americano e das instituições dominadas por ele, como o FMI e o Banco Mundial.

O que incomoda ainda mais Washington é a expansão recente do Brics. Com a entrada de mais cinco países, o bloco agora representa cerca de 47% da população mundial e responde por 36% do PIB global em paridade de poder de compra — superando o G7 em vários indicadores. Além disso, há uma crescente movimentação para que os países do Brics reduzam sua dependência do dólar nas transações internacionais, o que também pressiona a hegemonia econômica dos EUA.


O que são as tarifas comerciais e por que elas importam?

Tarifas comerciais são impostos cobrados sobre produtos importados. Elas podem ser usadas como instrumento de proteção à indústria nacional ou como retaliação política. No caso da ameaça de tarifas dos EUA contra o Brics, o objetivo seria dificultar o acesso de produtos desses países ao mercado norte-americano, tornando-os mais caros e, portanto, menos competitivos frente à produção local dos EUA.

O impacto dessas tarifas pode ser grande, sobretudo para países com forte relação comercial com os EUA. No caso do Brasil, os setores mais sensíveis a medidas desse tipo incluem o agronegócio, o aço, a mineração e o setor automotivo.


Brasil e Índia: protagonismo diplomático na crise

Durante a coletiva de imprensa, Lula foi enfático ao destacar que o Brasil não aceitará retaliações comerciais unilaterais e classificou as declarações de Trump como ofensivas à autonomia das nações. Ao lado de Narendra Modi, o presidente brasileiro reafirmou o compromisso com o diálogo internacional e o fortalecimento de laços entre os países do Sul Global.

Modi, por sua vez, reiterou que a união entre os países do Brics não tem como alvo qualquer outra nação, mas visa a construção de uma nova ordem internacional mais equilibrada e inclusiva.


Como o Brics pode responder às tarifas dos EUA?

Caso as tarifas sejam implementadas, os países do Brics têm à disposição várias alternativas:

  • Reforçar acordos bilaterais entre si, diminuindo a dependência do mercado norte-americano;

  • Ampliar transações comerciais em moedas locais, como já ocorre entre China e Rússia;

  • Recorrer à OMC (Organização Mundial do Comércio) para contestar as tarifas, se houver violação de acordos internacionais;

  • Adotar medidas de retaliação proporcional, impondo tarifas sobre produtos norte-americanos.

O fortalecimento do Novo Banco de Desenvolvimento (o “Banco do Brics”) e a criação de sistemas financeiros alternativos ao SWIFT são outras estratégias que vêm sendo discutidas internamente no bloco para aumentar a resiliência frente a sanções e pressões externas.


Impactos para o Brasil: ameaças e oportunidades

No caso brasileiro, as tarifas dos EUA contra o Brics podem representar um desafio imediato para setores exportadores. Em 2023, os Estados Unidos foram o segundo maior destino das exportações brasileiras, atrás apenas da China.

Por outro lado, essa tensão também pode abrir novas oportunidades. O fortalecimento das relações com Índia, China, África e Oriente Médio pode compensar eventuais perdas comerciais com os EUA. Além disso, o Brasil pode se firmar como um interlocutor diplomático respeitado, capaz de articular consensos e preservar pontes entre blocos econômicos rivais.


O fator geopolítico: Trump, eleições e populismo econômico

As declarações de Donald Trump acontecem em meio ao acirramento da campanha eleitoral nos Estados Unidos. Conhecido por seu estilo confrontador e populista, o ex-presidente tem reforçado sua retórica nacionalista e anti-globalista para mobilizar sua base conservadora.

A retórica contra o Brics pode, nesse contexto, ser interpretada como uma estratégia eleitoral, além de refletir a visão protecionista que pautou sua primeira gestão. No entanto, especialistas alertam que tais ameaças podem desestabilizar o comércio global e gerar efeitos colaterais negativos para os próprios EUA.


Soberania e diálogo em tempos de tensão

O embate entre os Estados Unidos e os países do Brics, catalisado pelas ameaças de tarifas comerciais unilaterais, escancara o momento delicado da política internacional. Diante disso, a reação de Lula — ao reforçar a soberania dos países do Brics e a defesa do multilateralismo — não é apenas um posicionamento pontual, mas parte de uma estratégia mais ampla de reposicionamento geopolítico.

Enquanto o cenário global se torna mais polarizado, o Brasil busca equilibrar pragmatismo econômico com protagonismo diplomático, mantendo abertas as portas do diálogo, mas sem abrir mão de sua autonomia.