Cresce desenquadramento do MEI: mais de 570 mil microempreendedores ultrapassam limite em 2024
O ano de 2024 marcou um salto expressivo no número de microempreendedores individuais (MEIs) que sofreram desenquadramento do MEI por ultrapassarem o limite de receita anual permitido pela categoria. Segundo dados da Receita Federal, consolidados por uma plataforma de contabilidade digital, mais de 570 mil CNPJs foram desenquadrados automaticamente por excederem os R$ 81 mil de faturamento anual — um número quase 30 vezes maior que o registrado em 2023.
Esse movimento não apenas surpreende pelo volume, mas também acende alertas sobre a defasagem no limite de receita do MEI, a falta de planejamento fiscal entre empreendedores e a necessidade urgente de revisão na legislação vigente.
Por que o desenquadramento do MEI aumentou tanto?
O crescimento expressivo dos desenquadramentos do MEI tem múltiplas causas. A principal delas é o próprio crescimento econômico de pequenos negócios — um bom sinal para o empreendedorismo, mas que, sem planejamento tributário adequado, pode gerar penalidades e custos extras.
Outro fator importante foi o avanço tecnológico da Receita Federal, que intensificou a fiscalização por meio de cruzamento de dados. Gastos em cartão de crédito, movimentações bancárias via Pix e emissão de notas fiscais são agora monitorados com maior precisão, o que permite identificar rapidamente quem excede o limite da categoria MEI.
Entendendo o limite de faturamento do MEI
Desde 2018, o limite de faturamento bruto anual do MEI está fixado em R$ 81 mil, ou cerca de R$ 6.750 por mês. Esse valor, no entanto, não acompanha a inflação nem o aumento dos custos operacionais dos pequenos negócios.
Segundo a legislação vigente, existem dois cenários para o desenquadramento do MEI:
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Faturamento excedente de até 20% (até R$ 97,2 mil): o MEI permanece na categoria até o final do ano-calendário, mas precisa pagar imposto sobre o valor excedido.
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Faturamento acima de 20%: o desenquadramento ocorre de forma imediata e retroativa, obrigando o empreendedor a recolher todos os tributos devidos desde janeiro como se fosse uma empresa do Simples Nacional.
Nos dois casos, a mudança de regime tributário exige maior organização, aumento das obrigações fiscais e, muitas vezes, apoio de um contador.
Como a Receita Federal detecta o excesso de faturamento?
A Receita vem aprimorando seu sistema de cruzamento de dados e ampliando os mecanismos de fiscalização. Atualmente, ela consegue detectar movimentações acima do permitido por meio de:
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Informações bancárias, especialmente via Pix;
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Gastos elevados em cartões de crédito pessoais ou empresariais;
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Notas fiscais eletrônicas emitidas acima da média;
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Informações obtidas por meio de marketplaces e plataformas digitais.
Essa automação tornou o processo de desenquadramento do MEI mais ágil, mas também mais impessoal — muitos microempreendedores são pegos de surpresa ao tentarem gerar boletos do DAS-MEI e descobrirem que foram excluídos da categoria.
Exclusão do MEI também dispara por inadimplência
O desenquadramento do MEI não acontece apenas por excesso de receita. Em 2024, mais de 1 milhão de CNPJs foram excluídos da categoria por inadimplência. O número mais que dobrou em comparação a 2023 e representa um salto gigantesco em relação aos dados de 2022.
As principais causas da exclusão por inadimplência são:
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Não pagamento do DAS-MEI mensal;
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Dívidas acumuladas com o INSS;
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Falta de envio da Declaração Anual do MEI (DASN-SIMEI).
Diferentemente do caso de excesso de receita, esses desenquadramentos por débito podem ocorrer mesmo que o empreendedor tenha faturamento abaixo do limite permitido.
O que fazer após o desenquadramento do MEI?
Apesar da exclusão, o CNPJ permanece ativo — o que permite ao empreendedor continuar operando o negócio com algumas condições. No entanto, é necessário realizar uma série de ajustes para evitar penalidades:
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Regularizar todos os débitos pendentes;
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Solicitar o enquadramento como Microempresa (ME) ou Empresa de Pequeno Porte (EPP);
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Atualizar a emissão de notas fiscais conforme o novo regime;
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Contratar obrigatoriamente um contador;
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Recalcular os tributos com base nas novas faixas de faturamento.
Especialistas recomendam que, antes mesmo do desenquadramento do MEI, o empreendedor faça uma análise mensal de sua receita e avalie com um contador se vale a pena migrar voluntariamente para outra categoria jurídica, reduzindo riscos de multas e juros.
Planejamento e apoio contábil são essenciais
A falta de comunicação prévia da Receita sobre o desenquadramento do MEI pode causar prejuízos inesperados. Por isso, é essencial que o microempreendedor:
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Acompanhe mensalmente seu faturamento bruto;
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Mantenha controle detalhado sobre entradas e saídas;
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Avalie os prós e contras da mudança para ME ou EPP;
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Evite o crescimento “invisível” que não é refletido nas declarações fiscais.
O planejamento tributário é um aliado indispensável para quem está em crescimento, mas quer evitar surpresas com a Receita Federal.
Mesmo com exclusões, número de MEIs continua crescendo
Apesar do aumento recorde nos casos de desenquadramento do MEI, o número total de microempreendedores no Brasil segue em ascensão. No primeiro trimestre de 2025, mais de 1,4 milhão de empresas foram abertas — sendo 77% delas na forma de MEI.
Esse número representa:
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Crescimento de 37% em relação ao mesmo período de 2024;
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Alta média de 12% ao ano na última década;
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Aumento de mais de 181% no número de MEIs ativos desde 2015.
Esses dados mostram que, mesmo com os riscos de desenquadramento, o regime MEI continua sendo a principal porta de entrada para a formalização no Brasil.
Defasagem do limite de faturamento pressiona os MEIs
O limite atual de R$ 81 mil anuais está defasado e não reflete mais a realidade econômica do país. Com a inflação acumulada desde 2018, muitos MEIs acabam ultrapassando esse teto sem, de fato, ampliarem significativamente seus negócios.
Esse cenário tem incentivado a tramitação de projetos no Congresso Nacional que propõem atualizar o limite para evitar o desenquadramento do MEI automático por excesso de receita:
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PLP 108/2021: propõe aumentar o teto para R$ 130 mil por ano;
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PLP 261/2023: estabelece reajuste anual com base na inflação (IPCA);
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PLP 24/2024: consolida os dois projetos anteriores em uma proposta única.
Caso aprovadas, essas mudanças trariam mais justiça fiscal, segurança jurídica e incentivariam a formalização de novos empreendedores.