Desvalorização do yuan: o que está por trás da nova política cambial da China em 2025 e seus impactos globais
A recente desvalorização do yuan, promovida pelo Banco do Povo da China (PBoC), reacendeu o debate sobre a guerra comercial entre China e Estados Unidos e seus desdobramentos sobre os mercados financeiros globais. Em um movimento estratégico, a autoridade monetária chinesa estabeleceu a taxa de fixação do yuan em 7,2038 em relação ao dólar norte-americano, superando o limite simbólico de 7,20 pela primeira vez desde setembro de 2023.
Esse ajuste, que ocorreu em 8 de abril de 2025, é amplamente interpretado como uma sinalização da postura de Pequim quanto ao suporte à sua moeda. A desvalorização do yuan vem em um momento de aumento das tensões comerciais com os EUA e ocorre paralelamente a medidas do governo chinês para conter os efeitos negativos em sua economia e nos mercados financeiros.
O que é a fixação do yuan e por que ultrapassar os 7,20 é relevante
A China adota um regime de câmbio semi-flexível, no qual o Banco do Povo da China determina diariamente uma taxa de referência para o yuan em relação ao dólar. Esse valor serve de âncora para as operações no mercado onshore, com uma banda de flutuação permitida de 2% para cima ou para baixo.
Quando a taxa de fixação do yuan ultrapassa níveis simbólicos, como o 7,20, isso costuma ser interpretado por analistas e investidores como uma flexibilização da postura de Pequim diante das pressões cambiais, permitindo que o yuan se desvalorize. Tal decisão afeta diretamente a competitividade das exportações chinesas, os fluxos de capitais internacionais e as expectativas sobre a economia do país.
Tensões com os EUA impulsionam a desvalorização do yuan
Outro elemento que influencia diretamente essa decisão do PBoC é a crescente tensão entre China e Estados Unidos. Com a nova rodada de tarifas comerciais impostas pelo governo de Donald Trump, Pequim tem buscado contramedidas estratégicas para minimizar os impactos sobre sua economia.
A desvalorização do yuan aparece, nesse contexto, como uma forma de mitigar os efeitos das tarifas sobre os produtos chineses, tornando-os mais baratos e competitivos no mercado internacional. No entanto, essa tática tem seus riscos. Uma desvalorização muito agressiva poderia provocar uma fuga de capitais, desestabilizar o sistema financeiro chinês e intensificar a hostilidade do governo americano.
Cotações do dólar e a trajetória da moeda chinesa
Às 8h30 (horário de Brasília) desta terça-feira, o dólar era negociado a 7,3386 yuans no mercado onshore — seu menor nível desde setembro de 2023 — e a 7,3631 yuans no mercado offshore, a menor cotação desde fevereiro deste ano. Esses valores indicam uma queda expressiva do yuan frente ao dólar em menos de 24 horas, reforçando a percepção de que há uma política deliberada de desvalorização do yuan.
Implicações da desvalorização do yuan para o mercado internacional
A política cambial chinesa tem grande relevância para os mercados globais, sobretudo porque a China é uma das maiores economias do mundo e seu comércio exterior impacta diretamente a dinâmica de países emergentes e desenvolvidos. Quando a China permite a desvalorização do yuan, isso tende a gerar os seguintes efeitos:
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Maior competitividade para os produtos chineses, prejudicando exportadores de outros países;
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Pressão sobre moedas de países emergentes, que acabam acompanhando a desvalorização como forma de proteger suas balanças comerciais;
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Aumento da aversão ao risco nos mercados financeiros, com fuga para ativos considerados mais seguros, como o dólar e os títulos do Tesouro americano;
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Preocupações inflacionárias globais, uma vez que a volatilidade cambial interfere nos preços das commodities e insumos industriais.
China tenta conter os impactos com medidas de suporte aos mercados
Na mesma madrugada em que anunciou a nova taxa de fixação do yuan, o governo chinês implementou medidas para sustentar os mercados financeiros domésticos. Uma das principais decisões foi autorizar que seguradoras locais ampliem seus investimentos no mercado acionário, através da Administração Reguladora Financeira Nacional (NFRA), órgão responsável por supervisionar o sistema financeiro chinês.
Essa iniciativa busca atrair liquidez para o mercado interno e equilibrar o impacto da fuga de capitais provocada pela desvalorização do yuan. Segundo especialistas, a medida também funciona como um sinal de comprometimento com a estabilidade financeira e de incentivo à confiança dos investidores institucionais.
Desvalorização do yuan não deve ser usada de forma agressiva, dizem economistas
Apesar da abertura para uma desvalorização do yuan, economistas alertam que o governo chinês não deve usar essa estratégia de maneira intensa. A razão é simples: uma desvalorização muito acentuada poderia ter efeitos colaterais graves, como:
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Intensificação da guerra comercial com os EUA;
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Aceleração da fuga de capitais estrangeiros da China;
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Diminuição da confiança internacional na moeda chinesa;
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Instabilidade nos mercados de ações e crédito.
Além disso, o Partido Comunista Chinês vem trabalhando para fortalecer o papel global do yuan, incluindo esforços para sua inclusão em reservas cambiais internacionais e no comércio de commodities como petróleo e gás. A desvalorização do yuan, nesse sentido, vai na contramão desses objetivos.
China busca equilíbrio entre estímulo econômico e estabilidade cambial
A gestão da taxa de câmbio é uma das ferramentas mais delicadas e estratégicas à disposição do governo chinês. A atual desvalorização do yuan tem caráter pontual e visa oferecer um respiro para exportadores chineses, ao mesmo tempo em que sinaliza a disposição de Pequim em responder às ações dos EUA.
No entanto, é improvável que vejamos uma política cambial agressiva e prolongada. Em vez disso, o mais provável é que o governo continue alternando momentos de flexibilização com medidas de controle cambial, buscando um ponto de equilíbrio que permita:
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Estímulo ao crescimento econômico;
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Manutenção da confiança dos mercados;
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Prevenção de choques cambiais desestabilizadores;
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Proteção contra sanções externas.
Reflexos da desvalorização do yuan para o Brasil
Para o Brasil, a desvalorização do yuan pode ter impactos tanto positivos quanto negativos. Entre os pontos de atenção estão:
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Commodities agrícolas e minerais podem ter aumento de demanda por parte da China, graças à maior competitividade dos preços internos chineses;
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A concorrência com produtos chineses pode se intensificar, dificultando exportações brasileiras para terceiros países;
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Volatilidade cambial e fuga de capitais dos emergentes podem afetar o real, elevando o dólar e pressionando a inflação;
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Empresas brasileiras que dependem de insumos chineses podem se beneficiar de preços mais competitivos.
Em um cenário de alta interdependência comercial, o Brasil precisa acompanhar de perto os desdobramentos da política cambial chinesa, especialmente em um ano de instabilidade geopolítica como 2025.
Desvalorização do yuan é mais um capítulo da guerra comercial China-EUA
A desvalorização do yuan promovida pelo Banco do Povo da China deve ser interpretada como uma medida tática diante da escalada das tensões comerciais com os Estados Unidos. Embora os efeitos dessa ação ainda estejam sendo absorvidos pelos mercados, é evidente que ela se insere em um cenário mais amplo de disputas por hegemonia econômica e tecnológica.
Para investidores, empresas e governos ao redor do mundo, compreender os mecanismos e impactos dessa movimentação cambial é fundamental para tomar decisões estratégicas e proteger-se da volatilidade crescente nos mercados internacionais.